De acordo com o Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar do Japão, o termo hikikomori é uma pessoa que se manteve isolada por mais de 6 meses consecutivos sem ir para a escola ou trabalho, e raramente interage com as pessoas fora os familiares mais íntimos. O termo foi dado pelo psiquiatra Tamaki Saito, no final dos anos 90.

Em dezembro de 2018, o Gabinete fez uma pesquisa inédita com pessoas com idade entre 40 e 64, e os resultados mostraram que cerca de 613 mil indivíduos nessa faixa etária são considerados hikikomori. Já as pessoas com idade entre 15 e 39 anos somam cerca de 541 mil com esta condição. A última pesquisa revelou que 76,6% das pessoas com idade entre 40 e 64 anos são reclusas, sendo que 46,7% vivem dessa forma há cerca de 7 anos e 34,1% disseram que os pais os sustentam financeiramente.

Um Problema Moderno com Raízes Antigas

O Ministro do Bem-Estar, Takumi Nemoto, descreveu os hikikomori de meia-idade como um fenômeno novo, mas os especialistas dizem que os resultados das pesquisam fornecem apenas um panorama sobre um problema que já acontece há algum tempo.

De acordo com o maior especialista em reclusão social do Japão, Saito Tamaki, as pessoas que se destacam ou fazem as coisas de forma diferentes são mal vistas no país, e por conta disso os japoneses tendem a hesitar fazer qualquer coisa que chame a atenção dos outros. Quando as pessoas se veem vivendo como um hikikomori, elas sabem que a sociedade as julgam mal, e por isso eles tem medo. A família pensa da mesma forma e ao descobrirem que um familiar não sai de casa e não trabalha, ela tenta a escondê-la da sociedade, ou seja, esse sentimento de vergonha perante a sociedade se estende à família dos hikikomori.

Saito também explica que as relações familiares ruins são geralmente a raiz do problema e os hikikomori raramente saem dessa situação sem o auxílio externo. Essa ajuda pode vir de um amigo, professor ou parente, intervindo de uma forma delicada, tentando convencer o hikikomori a procurar ajuda profissional.

Além disso, as pessoas tendem a pensar que eles são perigosos. Os meios de comunicação tem uma tendência a promover essa imagem, associando os hikikomori a crimes, mesmo estes sendo casos isolados e com um percentual extremamente baixo, que nem chega perto dos crimes cometidos pelas pessoas que não sofrem dessa condição.

Possível Origem do Problema e a Pressão da Sociedade Japonesa

Este é um tipo de fenômeno japonês que acontece geralmente por causa da pressão social e as grandes expectativas de ter sucesso nos negócios e nos estudos. Muitos acreditam que eles são o resultado da maneira como o Japão lida com os problemas psicológicos e mentais.

O Japão tem uma sociedade muito exigente e a pressão começa logo cedo. Espera-se que as pessoas estudem constantemente e é muito comum ver estudantes se dedicando mais de 8 horas por dia aos estudos, até mesmo nos finais de semana, feriados e férias. Para se ter uma noção, o Japão costumava ter mais dias de aula do que em outros países e quando o Ministro da Educação reduziu a carga horária escolar, muitos pais colocaram os filhos nos juku, um tipo de cursinho pré-vestibular para compensar as “horas perdidas” com o máximo de educação possível. Por causa da importância que se dá às provas no Japão, cerca de metade dos estudantes do ensino médio fazem o juku.

A vida social no Japão também é muito bem estruturada e com cheia de etiqueta, o que pode se tornar um complexo dependendo da situação. Por exemplo, os japoneses tem estruturas gramaticais diferentes que variam de acordo com a posição social da outra pessoa, seja ela um superior, cliente, idoso, jovem, etc. Até mesmo o até de se dar um presente precisa ser pensando com cautela, pois alguns itens podem ser considerados ofensivos (dar uma faca de cozinha para um casal recém casado, por exemplo, significa separação).

Como existe uma grande pressão para ter que ser correto o tempo todo, isso pode se tornar estressante. É praticamente impossível passar a vida sem passar vergonha pelo menos uma vez, mas em uma cultura onde o comportamento correto é muito valorizado, falhar nisso pode ser traumatizante.

Muitas vezes, um erro na área acadêmica ou social pode fazer um jovem se afastar da sociedade e se tornar um hikikomori. Também existe uma especulação que esse fenômeno social se dá, em parte, por causa da cultura da vergonha diante dos problemas de saúde mental. A depressão só foi reconhecida como um problema real no final dos anos 90, mas até os dias de hoje a doença é vista como uma desculpa para não trabalhar ou fazer nada.

Como Sobrevivem?

Muitos hikikomori se sustentam através do trabalho remoto, enquanto outros vem de famílias de classe média onde os pais os apoia financeiramente.

Os que são sustentados pelos pais acabam passando esse estresse da reclusão também para a família, que se sente presa à pessoa e não sabe o que fazer para ajuda-la a sair desse estado. Além disso, muitos hikikomori estão envelhecendo, juntamente com seus pais, o que se torna um problema ainda maior. Em 2017, por exemplo, os corpos de um casal de idosos foram encontrados em um apartamento junto do seu filho hikikomori de 43 anos, que mostrava sinais de inanição.

Já os hikikomori que se sustentam sozinhos são um fenômeno mais novo, já que por causa da internet ficou mais fácil fazer trabalhos remotos. Eles geralmente pedem comida em casa e, se necessário, saem à noite para fazer compras nos mercados 24 horas, nos horários de menor movimento.

Recuperação

Felizmente, alguns hikikomori conseguem se recuperar. Como o problema é social, boa parte do tratamento se baseia na normalização das interações sociais. Existem grupos de apoio para hikikomori, bem como artigos escritos e publicados por pessoas em processo de recuperação.

Uma das terapias mais utilizadas é a terapia de corrida, que busca combinar os benefícios da psicoterapia para a saúde mental com os do exercício físico. Além disso, alguns pacientes dizem que o Pokémon Go, por exemplo, os ajudaram com sua fobia social, já que se viam “obrigados” a sair de casa para caçar os Pokémon.

Outro método de tratamento incomum foi lançado por uma empresa japonesa, que consiste em vídeos de pessoas encarando a câmera. O objetivo é fazer com que os hikikomori se acostumem com o contato social virtualmente sem sair da segurança da sua casa antes de poder sair.

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